Conheça Caetité: a única cidade brasileira que produz urânio, com 54 mil habitantes e mina que pode chegar a 800 t/ano

Poucos brasileiros sabem, mas existe um único município no país responsável por concentrar toda a produção nacional de urânio — um metal estratégico, indispensável para a geração de energia nuclear.
Essa cidade de médio porte, com pouco mais de 50 mil habitantes, guarda sob seu solo uma das maiores riquezas minerais já identificadas no território nacional.
É nesse ponto específico do mapa que funciona a única mineração de urânio ativa do Brasil, responsável por transformar o minério bruto em um concentrado conhecido como yellowcake.
Essa etapa é essencial no processo de fabricação do combustível nuclear que alimenta reatores e garante autonomia energética em várias partes do mundo.
O que é o urânio?
O urânio é um elemento químico metálico, de número atômico 92 e símbolo U, pertencente à família dos actinídeos. Trata-se de um metal pesado, naturalmente radioativo, prateado quando recém-polido, mas que oxida rapidamente em contato com o ar, adquirindo tons amarelados ou esverdeados.
Principais propriedades
- Radioatividade: O urânio emite partículas alfa de forma natural.
- Isótopos: O mais abundante é o U-238, que corresponde a cerca de 99% do total. Já o U-235, embora represente apenas 0,7% da ocorrência natural, é o de maior interesse energético e militar, por sua capacidade de sofrer fissão nuclear.
- Densidade: É extremamente denso, cerca de 19 vezes maior que a da água, comparável à do ouro.
Na natureza, o urânio aparece em minerais como uraninita (pechblenda), carnotita e autunita, sempre em pequenas concentrações na crosta terrestre.
Usos estratégicos do urânio
O urânio tem múltiplas aplicações que o colocam no centro de debates sobre energia, defesa e pesquisa:
- Energia nuclear: O isótopo U-235 é usado como combustível em reatores nucleares, garantindo eletricidade de base e baixa emissão de carbono.
- Armas nucleares: O mesmo U-235, em altas concentrações, serve como base para a produção de armamentos atômicos.
- Pesquisas científicas: Essencial em estudos de radioatividade, geologia e técnicas de datação de rochas.
- Blindagem e projéteis: O chamado urânio empobrecido (DU), com menor teor de U-235, é empregado em blindagens militares e munições de alta penetração.
Por ser radioativo, o uso do urânio exige extremo controle, tanto para evitar acidentes ambientais quanto para prevenir riscos de proliferação nuclear.
A única mina ativa no Brasil
Atualmente, toda a produção de urânio brasileira ocorre em Caetité, na Bahia. É lá que se encontra a Província Uranífera de Lagoa Real, a mais importante jazida do país.
O município concentra as duas primeiras etapas do ciclo do combustível nuclear:
- Lavra: extração do minério do solo.
- Beneficiamento: transformação do minério em concentrado (yellowcake), que depois pode ser enriquecido para uso em reatores.
Capacidade produtiva e retomada das operações
A mina de Caetité possui capacidade instalada de aproximadamente 400 toneladas por ano de concentrado de urânio. Esse volume pode chegar a 800 toneladas anuais com a abertura de novas frentes, como a Mina do Engenho e a futura lavra subterrânea.
No passado, a principal frente de exploração foi a Mina Cachoeira, que funcionava a céu aberto. Após a exaustão desse depósito, houve paralisação temporária das operações. Em 2020, a produção foi retomada com novos licenciamentos ambientais e planos de expansão.
Projetos futuros: Santa Quitéria (CE)
Além da Bahia, o Brasil planeja explorar jazidas no Ceará, em Santa Quitéria, onde o urânio aparece associado a depósitos fosfatados. O projeto é liderado pela Indústrias Nucleares do Brasil (INB) em parceria com a Galvani.
A previsão é de produzir até 2,3 mil toneladas anuais de concentrado de urânio, além de ampliar a oferta de fertilizantes fosfatados no mercado nacional.
No entanto, o projeto ainda depende de licenciamento ambiental. Em 2025, o Ibama analisou o Estudo de Impacto Ambiental e solicitou ajustes antes da emissão da Licença Prévia.
Caso seja implantado, Santa Quitéria representará um salto na produção brasileira, reduzindo a dependência de importações.
Reservas e posição internacional
De acordo com o Red Book 2024 (IAEA/NEA), o Brasil possui 167,8 mil toneladas de urânio em “recursos identificados recuperáveis” até o custo de US$ 130/kg U (dados de 1º de janeiro de 2023).
Esse volume equivale a cerca de 3% do total mundial, colocando o Brasil na 9ª posição global, atrás de:
- Austrália
- Cazaquistão
- Canadá
- Namíbia
- Rússia
- Níger
- África do Sul
- China
O total mundial nesse critério chega a 5,93 milhões de toneladas.
Potencial de crescimento das reservas
O Serviço Geológico do Brasil (SGB) aponta que o país pode avançar no ranking internacional à medida que os levantamentos geológicos se aprofundarem.
Só em Lagoa Real, na Bahia, já foram identificados mais de 99 mil toneladas de recursos em urânio. Além disso, o Plano Decenal de Geologia (PLANGEO 2026–2035) prevê novos estudos específicos sobre o mineral, reforçando sua importância estratégica.
Assim, embora Caetité seja hoje a única produtora ativa, o futuro pode trazer uma nova configuração, com Santa Quitéria e outras jazidas ampliando a oferta nacional.
O urânio é considerado uma terra rara?
Uma dúvida comum é se o urânio faz parte do grupo das terras raras. A resposta é não.
Diferença principal
- Urânio (U): pertence à família dos actinídeos, número atômico 92, radioativo, estratégico para energia e defesa.
- Terras raras: grupo de 17 elementos químicos, que incluem os lantanídeos (do lantânio ao lutécio), mais o escândio e o ítrio. Eles não são radioativos em condições normais e são usados em ímãs, baterias, turbinas e dispositivos eletrônicos.
Onde está a confusão?
O urânio pode ser confundido com terras raras porque:
- Ele também é relativamente raro em concentrações utilizáveis.
- Suas jazidas, em alguns casos, estão associadas a minerais que contêm elementos de terras raras.
Mas, do ponto de vista químico e geológico, o urânio não faz parte desse grupo.
Recurso estratégico
O urânio é um recurso estratégico que coloca o Brasil em posição de destaque no cenário energético e geopolítico mundial.
Hoje, toda a produção nacional está concentrada em Caetité, na Bahia, com capacidade de 400 toneladas por ano, mas com potencial de atingir 800 toneladas.
O futuro aponta para Santa Quitéria, no Ceará, que poderá multiplicar a produção e transformar o Brasil em um dos principais players do setor.
Com reservas já identificadas de 167,8 mil toneladas e potencial para descobrir ainda mais, o país ocupa o 9º lugar no ranking mundial, mas tem condições de subir posições.
Enquanto isso, o debate sobre a exploração responsável, o licenciamento ambiental e a segurança nuclear continua sendo central.
Afinal, o urânio não é apenas um minério: ele representa poder energético, independência estratégica e desafios ambientais que exigem atenção constante.
Escrito por Fabio Lucas Carvalho - clickpetroleoegas.com.br
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